Zona de Interesse

Avaliação: 5 de 5.

Nos seus 104 minutos de duração, o grandioso filme de Jonathan Glazer, intitulado ‘The Zone of Interest’, é um estudo experimental sobre o nazismo e seus impactos mais intrínsecos na sociedade pós-moderna. Completamente imerso no brutalismo alemão de seus cenários frios e na reflexão estética de alta claridade, o filme segue seus caminhos pré-estabelecidos desde o início. Envolve-se em uma atmosfera absolutamente sombria e uma sonoplastia de tirar o fôlego. A premissa se inicia com a escuridão e termina no mesmo tom, trazendo assim uma justaposição com a natureza expositiva de toda a pintura visual minuciosamente criada pelo diretor.

Comunicando tudo de maneira silenciosa e trabalhando a quietude do ambiente casual de uma família alemã que comanda nos campos de concentração de Auschwitz, em contrapartida aos barulhos de fundo que evocam o mais visceral terror causado pelas mazelas da crueldade fascista alemã, o filme coloca em protagonismo um mal invisível que se faz visível em ações, palavras de exatidão, olhares de falsa ingenuidade e a linguagem corporal dos personagens. Tudo é meticulosamente criado para a inserção do espectador em um nível além do físico, transbordando para o espiritual.

As atuações trabalham de forma orgânica na tela, assim como a direção. Glazer optou por câmeras paradas em praticamente todas as cenas, exceto algumas focadas na natureza dos ambientes dos campos. Com essa escolha, ele causa um efeito quase hipnótico para quem assiste. Mesmo com o ritmo mais lento do filme, tudo parece caminhar de maneira específica. Examinando seu entorno, o que mais me impressionou, principalmente visualmente falando, foi a destreza da edição do longa. Acredito que, para construir uma história complexa com pouco, é necessária uma investigação incisiva na narrativa, adicionando também o sentimentalismo como plano de fundo, mas sem deixar parecer que o retratado em tela é de qualquer âmbito fútil.

Partindo para uma análise mais crítica, é possível afirmar que em alguns momentos o filme parece estar perdido dentro de sua própria atmosfera. No entanto, isso é rapidamente resolvido com montagens de cenas, como a da personagem feminina que aparece em alguns takes em câmera noturna catando maçãs pela natureza e espalhando pelo solo como forma de comunicação para os judeus oprimidos nos campos de trabalho. Esse tipo de cena não só traz a questão humanitária para o estudo de opressão social, como também expõe a necessidade de Glazer para gerar um certo alívio perante um senso de crueldade que se instaura durante a obra em todo.

A linguagem principal do filme é baseada nos detalhes estéticos da história. Por focar na intimidade de uma família nazista, não há espaço para humanidade em sua forma mais pura, pois pressupõe-se que as ações dos personagens, por mais banais e inocentes que pareçam, reverberam sobre a profundidade da desigualdade, em comparação com uma família judia do outro lado do muro, mesmo que esse grupo de personagens não exista necessariamente na trama. Com base no que sabemos sobre a Segunda Guerra Mundial, isso é mais do que possível. Há espaço para interpretação em diversas cenas, embora a maior parte do tempo o filme seja de fácil digestão. Destaco a destreza nos ângulos de filmagem, que em grande parte são tão bonitos que você até esquece o que está assistindo, mas não demora muito para a realidade macabra voltar à tona.

Falando sobre destaques, gostaria de ressaltar que considero a sonoplastia desta obra talvez uma das melhores que já ouvi até hoje. Há uma habilidade em capturar a crueldade em forma de som, contrastando com o ideal sentimentalista do sofrimento judaico, algo que ‘A Lista de Schindler’, por exemplo, aborda. Nessa comparação, o que Spielberg fez em sua obra, Glazer realiza de maneira mais simplista e menos explícita. Demonstrando a gravidade de um genocídio de povos por meio de meros sons, o filme detém uma inteligência emocional muito aguçada. Poderia facilmente ter caído na utilização exagerada desse recurso, mas não é o caso. Há um constante ruído sonoro que parece ser exatamente o barulho de uma fornalha que queima sem cessar. E quando há qualquer tipo de silêncio neste filme, ele consegue ser mais alto que qualquer som estridente.

Sobre o resto dos aspectos técnicos do filme, a fotografia é límpida e brilhante, conquistando os olhos de imediato. Apesar do ritmo do filme ser mais cadenciado, ele não permite que o espectador permaneça estagnado por muito tempo. Há também cortes específicos que são mais rápidos que outros, o que às vezes causa uma sensação de aceleração e desaceleração alternadas de forma compassada. Mais para o final da trama, o filme parece focar mais na logística da guerra e na força do nazismo, concentrando-se quase inteiramente no personagem masculino que é o “provedor” da casa e um comandante da SS. Todos os lados do personagem são mostrados, desde sua ambiguidade em relação à família até sua leve sensação de repugnância perante a situação em que se encontra, destacando a complexidade de estar em uma posição de poder onde a morte é a moeda de troca.

Em síntese, ‘The Zone of Interest’ emerge como uma poderosa exploração do cataclisma nazista e suas implicações sociais e emocionais. Através de sua estética sombria, atuações marcantes e trilha sonora excepcional, o filme mergulha o espectador em um mundo de crueldade e desumanidade. Ao mesmo tempo, desafia-nos a refletir sobre a natureza da violência e do poder, destacando a complexidade das relações humanas em tempos de guerra. É uma obra que ecoa além das telas, lembrando-nos das profundezas da depravação humana e da necessidade contínua de confrontar nosso passado para moldar um futuro mais compassivo.