Mill Valley – One Fine Morning, Mother and Son, Living

“One Fine Morning”: Acompanhando Sandra (Léa Seydoux), Mia Hansen-Løve gradualmente constrói uma história sensível e delicada sobre o valor das relações humanas, sejam elas amorosas ou familiares. Sandra cuida do seu pai Georg (Pascal Greggory), um professor de filosofia que foi diagnosticado com uma doença degenerativa que o inibe de realizar funções simples, como ler ou distinguir pessoas. Sandra deve conciliar os cuidados do pai com a sua vida profissional e amorosa, que funcionam como um porto-seguro para ela, que embora se preocupe com seu pai, decide não deixar de viver a sua própria vida. As questões relacionadas à doença de Georg são retratadas de com um toque real e refinado, mas também de maneira que expande a visão sobre como isso afeta os outros ao seu redor, não só emocionalmente mas também financeiramente. 

Além da direção sofisticada e urbana de Hansen-Løve, o roteiro ,que também é assinado por ela, traça as relações dos personagens de uma maneira singular e empática. Hansen-Løve em momento algum coloca uma lente julgadora em cima das ações de Sandra, que se envolve com um homem casado, pelo contrário, ela mostra como o ser humano encontra nas ocasiões mais distintas um certo tipo de conforto. Seydoux interpreta Sandra com uma vulnerabilidade respeitável, porque apesar de tudo que acontece com ela, Seydoux prefere a empatia sincera do espectador do que a compaixão artificial. Ela traz um tom de verdade a sua personagem que é muito vista nos filmes do cineasta Éric Rohmer, onde as maiores emoções são transmitidas através dos menores gestos ou olhares. É um trabalho sincero que funciona devido à grandiosidade da combinação entre Seydoux e Hansen-Løve, de maneira em que as duas formam um par perfeito e funcionam em perfeita harmonia.

Em “Mother and Son”, a diretora Léonor Serraille explora a vida de Rose (Annabelle Lengronne) e de seus dois filhos, Jean e Ernest. Imigrantes recém chegados na França, a diretora acompanha o crescimento dos meninos e o papel de Rose em suas vidas. O filme que é construído em cima de uma história familiar mostra as diversas camadas da relações de seus membros com o país em que eles vivem. O que aparenta ser uma família comum se torna cada vez mais disfuncional com o passar dos anos, e Serraile desconstrói a imagem que costumamos ver em filmes. A diretora exibe os conflitos causados ao longo de suas vidas de maneira franca, sem tornar esse drama familiar em um melodrama enfadonho. Os temas de racismo e imigração são abordados de maneira convencional mas também sútil, focando mais em como o racismo cotidiano isola as suas vítimas ao longo prazo. 

A construção das passagens de tempo dá à Lengronne uma chance de mostrar o seu alcance como atriz. Nós acompanhamos o amadurecimento de Rose com o passar dos anos e Lengronne é completamente fascinante no papel principal. No começo ela é apaixonada e até mesmo um pouco ingênua, procurando nos homens da França uma maneira de se encontrar na cidade. Depois, ela é a mãe protetora que só quer dar uma vida melhor aos seus filhos. Já no último ato, Lengronne tem a oportunidade de mostrar toda sua força dramática de forma visceral e desoladora. Em seu encontro com seu filho mais novo, ela expressa a dor e o arrependimento de uma maneira sublime. Sua maneira impenetrável e seu lema de “nunca chorar” não se sustentam quando ela é confrontada com o passado, e tudo isso só funciona por conta da entrega da atriz. 

Mesmo que o filme siga as fórmulas esperadas de um drama convencional, Serraille constrói um digno retrato de uma família que procura de todas as maneiras uma forma de pertencer. 

“Living” dirigido por Oliver Hermanus, inicia com Peter Wakeling (Alex Sharp) se dirigindo ao seu primeiro dia de trabalho em um escritório do governo britânico pós Segunda Guerra Mundial. Mas logo fica claro que este não é um filme sobre o início de uma vida, e sim do final de uma. Mr Williams (Bill Nighy) é o chefe do gabinete onde Wakeling começa a trabalhar, ele descobre que está com uma doença terminal.

A ótima performance de Nighy é o alicerce do filme. Com muita sutileza ele navega as emoções de um homem que está refletindo sua vida após vivê-la da maneira mais correta possível, assim como exigia seu burocrático trabalho. Após a descoberta de sua doença, Mr Williams tenta experimentar os momentos que deixou escapar durante sua vida e busca deixar uma marca positiva de sua passagem pela Terra. Aimee Lou Wood também se destaca como a inesperada amiga Margaret. Este remake de ‘Ikiru’ de Akira Kurosawa é um singelo e charmoso filme sobre o propósito de uma vida.


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