The Woman King

Avaliação: 4 de 5.

“A Mulher Rei” é ambientado no Reino do Daomé no século XIX. Durante o período o Reino estava em conflito com o Império de Oyo, ao qual estava subjugado e pagava tributos. Neste contexto acompanhamos as Agojie, um regimento militar composto apenas por mulheres, que defende o Reino de Daomé de seus inimigos.

Desde a eletrizante cena de abertura, a diretora Gina Prince-Bythewood entrega ótimas sequências de ação, que foram o ponto alto em “The Old Guard”. Como no seu filme anterior, as lutas em equipe apresentam ótimas coreografias, que aqui introduzem o quão poderosas as Agojie são. Em poucos minutos de tela a excelente Viola Davis expõe toda a intensidade, autoridade e fúria da general Nanisca. Lideradas por ela, as mulheres derrotam guerreiros Mahi aliados ao Império de Oyo, libertando prisioneiros que seriam vendidos como escravos.

Somos introduzidos a Nawi (Thuso Mbedu), uma residente de Daomé que é entregue pelo seu pai ao rei Ghezo (John Boyega) após a sua recusa em casar com diversos homens aos quais ele tentou vendê-la. Em seu treinamento para tornasse Agojie, Nawi é guiada por Izogie, interpretada pela imensamente carismática Lashana Lynch. Através dos conflitos políticos e do treinamento de Nawi, somos apresentados ao Reino de Daomé e sua cultura. Os rebuscados design de produção e figurinos fazem um ótimo trabalho em reconstruir o local. No entanto, apesar de apresentar um ritmo fluido, a montagem peca em alguns momentos. Uma curta cena de um conflito entre duas Agojie novatas, uma residente de Daomé e outra oriunda dos Mahi, quebra o ritmo de uma sequência e não adiciona em nada ao filme.

Além das excelentes cenas de ação, o filme brilha nos momentos dramáticos com as ótimas atuações do elenco. Davis aos poucos desconstrói o semblante duro e imponente de Nanisca, mostrando a sua fragilidade decorrente de um trauma do passado. Mbedu que no ano anterior entregou uma excelente performance na minissérie “The Underground Railroad”, repete o feito aqui. Ela transparece a inquietação e arrogância de Nawi e consegue se manter no nível de Davis nas cenas em que suas personagens entram em conflito. Outro destaque é Sheila Atim, que interpreta Amenza, uma Agojie próxima de Nanisca.

Além dos conflitos com o Império de Oyo, o filme também conta com o dilema moral envolvendo os mercadores de escravos. Nanisca acredita que o Reino deve focar na exportação do óleo de palma, encerrando o relacionamento com os traficantes de escravos, aqui representados por dois personagens brasileiros: Santo Ferreira (Hero Fiennes Tiffin) e Malik (Jordan Bolger). A trama secundária do romance entre Malik e Nawi não é tão bem desenvolvido mas trás pontos interessantes. A mãe de Malik era do Reino de Daomé e foi vendida como escrava para o Brasil.

O roteiro de Maria Bello e Dana Stevens acerta dando à personagem de Davis o peso de conhecer pessoalmente os horrores da escravidão, dando base às suas motivações. Também acerta quando fica claro que os traficantes de escravos irão negociar com as tribos rivais caso Daomé encerre as relações.

Após o lançamento a veracidade dos aspectos históricos do filme foram questionadas. Historicamente o rei Ghezo só concordou em acabar com o tráfico de escravos em 1852, após anos de pressão do governo britânico. Em um momento ele considerou a exportação como óleo de palma como principal fonte de renda, mas não sendo tão lucrativo ele voltou a participar no tráfico de escravos.

No entanto o longa não ignora essas questões, longe disso, ele comenta diretamente sobre como a dinâmica de poder ocorria entre as tribos africanas. A escolha entre auxiliar o tráfico de escravos ou se tornar economicamente frágil ao ponto de se colocar em risco de ser escravizado, está bem simbolizada. “A Mulher Rei” funciona como um catártico filme de ação tanto como um comentário sobre o real inimigo, que foi a colonização europeia no continente africano.


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