O anseio do que está por acontecer muitas vezes prolonga e aumenta os sentimentos. A curiosidade e angústia causadas pelo vazio pode se tornar algo desconcertante. Ao ser colocada em frente a uma situação de encontro com o passado, Faye (Dale Dickey), a protagonista de ‘A Love Song’, se vê aguardando uma incógnita. Viúva e sem laços com outras pessoas, a personagem busca o conforto no desconhecido. Ela aguarda com esperança, na busca pelo amor, mesmo que talvez isso seja algo que ela não conheça mais.
Faye, em certo momento do filme, diz que não sabia o que era amor, mas que aprendeu que na prática era algo fácil. As músicas começaram a fazer sentido. O conforto de ter alguém à sua espera é fácil de se acostumar. Ao perder o marido, Faye disse que desaprendeu o que aquilo significava com a mesma intensidade de quando o descobriu. É como se fosse obrigada a começar do zero. Para ela, a solitude e o silêncio foram necessários para que pudesse seguir em frente. Anos adentro do luto, ela decide tentar se reconectar com um amigo do seu passado.
A pessoa que Faye tanto aguarda é Lito (Wes Studi), um amigo de infância. Ela espera por ele em seu trailer, que está estacionado de frente para um lago em uma locação montanhosa. Os seus dias são monótonos e repetitivos, com a única interação corriqueira sendo com um carteiro, a quem ela sempre espera que traga notícias sobre Lito. A única interação que Faye tem além dele é com um grupo de homens e uma menina que pedem para que ela estacione em outro lugar para que eles possam desenterrar o seu falecido pai que está enterrado ali, e com um casal lésbico que, ao acampar perto de seu trailer, convida ela para jantar. Faye não se abre facilmente, tanto com o casal quanto com os familiares que buscam pelo pai. Ela parece impenetrável, o diálogo entre eles nunca se aprofunda, apenas o básico é dito.
O encontro com Lito vem quando Faye menos espera. O primeiro contato é desconfortável, nenhum dos dois sabe como agir. Tanto tempo se passou, eles não sabiam se ainda eram os mesmos. O constrangimento inicial logo se torna algo mais suportável conforme eles vão se abrindo um para o outro. Eles lembram e falam do passado porque aquilo parece a única coisa que eles têm em comum. Mesmo com o reencontro, Faye ainda resiste, ela não sabe se aguenta passar por tudo aquilo de novo, mas parece disposta a tentar. Os dois falam sobre a vida com o luto e os arrependimentos do passado. Tanta coisa podia ser feita de uma maneira diferente. Ambos encontraram conforto na solidão, o que acabou minando qualquer chance que eles poderiam ter. Apesar de passar a noite juntos, Lito não parece pronto para deixar o passado para trás, e Faye, que também luta com isso, nem precisa de algum tipo de explicação.
Dale Dickey, mais conhecida por seus papéis como coadjuvante em “Breaking Bad” e “Winter’s Bone”, tem a chance de entregar a performance definitiva da sua carreira no seu primeiro papel principal. A atriz entrega uma atuação sublime como Faye. Ela é delicada, vulnerável e firme na medida certa. Dickey entrega emoções cruas com tanta simplicidade e naturalidade que é como se ela não estivesse atuando. Mesmo que a sua postura seja forte e séria, existe uma tristeza em seu olhar e um peso em suas costas. Ela carrega toda a dor do luto e da solidão de uma maneira sincera e humana. Rejeitando qualquer tipo de vaidade ou exagero, a atuação de Dickey se torna, sem dúvidas, uma das melhores do ano.
O filme se sobressai ao evitar ser tudo que Nomadland de Chloe Zhao foi. O poverty-porn de Zhao sempre soou como algo falso e desprovido de qualquer tipo de emoção genuína. A história exploradora do sofrimento alheio caiu na categoria de Oscar bait e se tornou um retrato superficial sobre a humanidade que encontramos nas relações interpessoais. Enquanto Zhao utilizou o ambiente de maneira exagerada para replicar cenas genéricas de paisagens, Max Walker-Silverman, diretor de A Love Song, utiliza para moldar a personalidade de seus personagens. A conexão de Faye com o solo, as montanhas e as estrelas têm como finalidade mostrar como aquele ambiente é importante para sua evolução pessoal. São nessas pequenas coisas que a natureza trás que Faye encontra conforto.
A Love Song encontra na simplicidade e no naturalismo uma maneira de criar um filme que ecoe em sua existência. A grandeza do longa não vêm através do orçamento ou de um elenco cheio de rostos conhecidos, mas sim de uma narrativa humana com uma mensagem poderosa sobre o luto, o arrependimento, o auto descobrimento e a eterna busca pelo amor.