Locarno 2025 – A Balcony in Limoges, Desire Lines & Mosquitoes

Talvez imprevisibilidade não seja a palavra certa para descrever A Balcony in Limoges, de Jérôme Reybaud. O filme reconhece constantemente o quão previsível e imprevisível pode ser, brincando com o texto para descentralizar sua direção, sugerindo assim um interesse em nos guiar diretamente, sem mais delongas. Esse tom intransigente também é o estilo de vida de Gladys (Fabienne Babe), que vive a vida como talvez devêssemos: ela não se importa com nada, bebe e dança, expressando seu humor por meio desses artefatos bobos que dizem muito sobre ela.

Tudo muda quando ela conhece Eugénie (Anne-Lise Heimburger), que busca ajudá-la, dar-lhe um rumo em sua vida despreocupada e sem-teto como uma forasteira da moral e dos bons costumes. Uma relação interessante emergiu disso, pois envolve dois polos que se opõem em todos os sentidos, mas que permanecem em uma dinâmica que funciona enquanto a bondade deixa de existir de um lado. Neste ponto, estou condicionado a acreditar que Jérôme Reybaud está mais preocupado em apresentar o tom dúbio do discurso moralizante do que em servir de fato a uma bela narrativa sobre mulheres que se unem, seja como forma de apoio ou pela necessidade de se fortalecerem mutuamente.

O longa funciona como uma espécie de crônica, que percorre o estilo de vida e uma conformidade com a realidade. É, de fato, um filme muito real: apresenta visuais, ambientes e diálogos crus que transmitem as emoções de suas personagens. É interessante, mas, como eu disse no início, sabemos que chegará a algum lugar (não veja pelo plano da obviedade), essencialmente porque ninguém que vive como Gladys consegue, na vida real, escapar do fardo de não ser livre. E Jérôme Reybaud acerta em cheio ao mostrar isso, sem demonizar a personalidade da personagem; muito pelo contrário, há uma poética impressa nela, sobre liberdade. E nisso, o diretor não se faz de desentendido, pois cria, escreve, decupa e dirige com base no destino da personagem, e, portanto, o faz por meio de uma representação feminina que se volta para a tragédia. Essa, realmente, é a palavra certa aqui.

É difícil prever as direções que Desire Lines, dirigido por Dane Komljen, acaba tomando ao longo de sua duração. O filme abraça uma dezena de combinações temáticas e visuais, embora o faça com notável fluidez. Em seu cerne, há questionamentos, mas também respostas. Um foco evidente na atitude, no controle (ou na falta dele) do corpo, da pele e de tudo que dela pode resultar: contato, força, paz, amor, ódio. As indagações são muitas, e Komljen não se apressa em respondê-las. Talvez aí esteja sua maior virtude: ao adotar um viés cinematográfico denso, o longa nos coloca numa posição ambígua, entre o saber e o pressentir o rumo dos atos que vemos em tela.

Sabemos que eles vão, e seguem. Mas isso não é uma resposta, tampouco a intenção do diretor. No filme, acompanhamos Branko, que vive de forma singular no campo esquerdo de Belgrado: à margem de tudo e todos, inclusive de seu irmão, com quem mal fala e que constantemente o coloca sob suspeita de algo que ele não sabe o que é, mas quer descobrir. À medida que a obra avança, o que está em jogo se revela com mais clareza. A edição atua como cola desse suposto quebra-cabeças: nos coloca, o tempo todo, como observadores rasteiros de Branko e suas caminhadas, ações lentas, idas e vindas. Às vezes levamos um choque, porque, de novo, não há como prever o filme.

Há, sobretudo, uma desconstrução constante das próprias imposições do diretor. Se algo estranho é inserido, logo algo tão estranho quanto acontece; se algo belo e simbólico aparece, outro momento igualmente belo e simbólico o acompanha. Trata-se de um jogo contínuo – com nuances psicológicas e sociais – em que os questionamentos, persistentes, são parte tanto do texto quanto da forma como as certezas do filme são erguidas e depois destruídas. É uma constante vibração de expectativas, com diálogos que conduzem e um tom humano-devocional-corporal que instiga do começo ao fim.

É interessante como Mosquitoes, de Valentina Bertani e Nicole Bertani, consegue equilibrar com precisão suas incursões na comédia e no drama. Embora pudesse facilmente se encaixar na Sessão da Tarde por sua acessibilidade, o filme recusa a simplicidade. Seu texto afiado e os visuais deslumbrantes – que recriam com perfeição os anos 90 – brindam com a jovialidade de um drama autoral, enraizado em memórias íntimas que inspiraram sua criação.

A câmera se move com rispidez, criando ângulos que nos fazem invadir o espaço dos personagens. No núcleo central, três meninas atuam com a naturalidade e o timing de profissionais experientes, construindo uma dinâmica surpreendente. Há momentos que flertam com a fantasia, reforçando que, apesar de lidar com temas adultos, este ainda é um filme que mira na juventude, desafiando expectativas comuns ao gênero coming-of-age.

Sobretudo, Mosquitoes é acolhedor: apresenta figuras queer em busca de pertencimento e situa essas vivências em meio a experiências universais da infância. Essa abordagem, um tanto atípica, expõe aventuras e devaneios que a direção impõe como se fossem pontos de vista autênticos, capazes de expurgar sensações que acumulamos durante a sessão. É uma proposta de experiência que se opõe à comodidade que o tom leve poderia oferecer, e justamente por isso se torna tão instigante.


VEJA TAMBÉM