CIFF 2023 – As Filhas do Fogo

Parte da nossa cobertura do 59th Chicago International Film Festival

Pedro Costa, nascido em 1959 em Lisboa, é hoje considerado um dos principais representantes do cinema português na era contemporânea. Sua abordagem singular de temas políticos e sociais parece ser sua marca registrada. O modo como o diretor explora as vidas das classes marginalizadas da sociedade, incluindo imigrantes e pessoas em situação de vulnerabilidade, é o que torna suas obras tão relevantes e universais. Esta capacidade de transcender qualquer barreira linguística destaca não apenas sua habilidade como cineasta, mas também sua sensibilidade em capturar a humanidade nas experiências dessas pessoas.

Em “As Filhas do Fogo”, seu novo curta-metragem, Costa conta a história de três irmãs separadas pela erupção de um vulcão. As três aparecem em cena ao mesmo tempo, cada uma em seu próprio quadro. Enquanto uma vagueia sem rumo, outra repousa sobre um solo rochoso, enquanto a terceira permanece imóvel, oculta nas sombras. Juntas, entoam um coro de lamentações, expondo sentimentos de solidão, medo e exaustão diante da vida, onde nossos esforços parecem incapazes de aliviar nossas dores e sofrimentos. “Haverá um momento em que entenderemos por que sofremos”, murmura uma delas. A sensação de inércia é amplificada pela habilidade de Costa em capturar a complexidade da luz e das sombras em cada cena. O diretor nos obriga a expandir nossa percepção não apenas para acompanhar os três quadros entrelaçados, mas também para enxergar além do que ele nos mostra.

Em seu novo trabalho, Costa não negligencia o componente social que o acompanhou até o momento. “Nós devemos viver e trabalhar”, enfatiza uma das irmãs. O sistema capitalista parece determinado a transformar o indivíduo em uma máquina de produção. Nossos sentimentos e dores não podem obscurecer nossa determinação de sobreviver; portanto, continuamos nossas vidas como se nada pudesse nos abalar. No entanto, este comentário é apenas um vislumbre de uma ideia que o diretor pretende explorar no futuro.

Apesar de tudo isso, este não é o tipo de filme que normalmente esperaríamos de alguém como Costa. Aqui, testemunhamos uma abordagem nunca antes vista em sua filmografia. Para começar, o curta-metragem é essencialmente composto por apenas uma cena musical. É um território novo para o diretor, mas graças ao talento de Elizabeth Pinard, Alice Costa e Karyna Gomes, as cantoras que interpretam as três irmãs, tudo se encaixa perfeitamente. Além de explorar um novo gênero, Costa parece também estar experimentando um estilo narrativo diferente. Logo após a performance musical, o curta-metragem muda completamente de tom, apresentando imagens documentais de Cabo Verde. Essas imagens, claras e vívidas, funcionam como um contraponto para toda a escuridão dos primeiros minutos do curta. É profundamente inspirador ver um diretor que, aos sessenta e quatro anos, ainda nutre seu amor pelo cinema de uma maneira tão inovadora. Ao sair de sua zona de conforto, a recompensa que Costa proporciona não é apenas pessoal, mas também para todos aqueles que celebram a sua voz.