CIFF 2023 – Here

Parte da nossa cobertura do 59th Chicago International Film Festival

Sequências de uma construção em andamento dão início à “Here”, o novo filme de Bas Devos, diretor belga responsável por trabalhos como “Ghost Tropic” (2019) e “Violet” (2014). Desde os primeiros momentos, as imagens resplandecem com um conflito que ecoa ao longo do filme: o embate entre o concreto e a natureza. Cenas de edifícios sendo erguidos são sempre entrelaçadas com detalhes naturais. O primeiro objeto de observação neste cenário, além do óbvio ao seu redor, é Stefan (interpretado por Stefan Gota), um trabalhador romeno que se prepara para uma viagem a Bruxelas. Tanto sua jornada quanto seu cotidiano estão repletos de interações aparentemente triviais aos olhos desatentos. É durante a viagem de Stefan que conhecemos Shuxiu (Liyo Gong), uma briologista completamente dedicada. Ela investe todo o seu tempo na profissão, seja examinando novas espécies de musgos ou ministrando aulas sobre o assunto. Por obra do acaso, os dois se conhecem e começam a trocar suas vivências. 

O filme de Devos não é uma história de amor. Quase não é uma história. É um estado de consciência; uma percepção aguçada do tempo e do espaço, onde o propósito de tudo é conhecido. Não porque está predestinado, mas porque precisa haver um propósito. A relação que o filme estabelece com seus personagens dá a impressão de que, independentemente do nosso envolvimento, cada interação humana tem um significado. Parece ser uma via de mão dupla, onde tudo o que você oferece é reciprocamente recebido. Nesse contexto, entregar-se ao outro parece ser a escolha natural. Stefan, apesar de levar uma vida completamente diferente da de Shuxiu, parece profundamente absorvido pela paixão dela por sua profissão. Ele a escuta falar como se fosse um de seus alunos, como se tudo o que ele estivesse absorvendo estivesse prestes a transformar sua percepção do mundo ao seu redor. E, de certa forma, isso de fato acontece.

A interação entre os dois transcende qualquer barreira cultural ou social. Não há nada que os impeça, pois a existência de tal obstáculo seria contrária à sua filosofia. Devos captura aqui a essência mais etérea da interação humana. Cada olhar, toque e fala parece ecoar como uma experiência espiritual profunda. As idas e vindas não interrompem histórias; em vez disso, funcionam como pontos de partida para novas narrativas. Pelo menos, é assim que o final do filme sugere. A ausência de uma resposta não apenas preserva o status, mas também eleva a maestria de Devos. Ao se recusar a fornecer uma solução fácil, ele questiona tudo o que foi apresentado anteriormente. O questionamento persiste, tanto para nós, espectadores, quanto para seus personagens. E a vida continua, simplesmente porque precisa continuar.


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